5.28.2014


Finalmente, vai nascer o verdadeiro PS
Ó Costa, apressa-te filho!


Vindo de um recôndito ponto da Via Láctea, chegou a Lisboa António Costa, que vai dar à luz o verdadeiro PS. Informou os jornalistas que o PS dos últimos 40 anos não passa de um boneco insuflável. «O PS socialista e de esquerda está aqui comigo, no meu ventre».

Pronto. Está explicada a razão que levou o PS a ter uma vitória pífia nas eleições europeias. Foi a cara do Tó Zé. Ou seja: não foi o PS; foi o PS à Tó Zé. Se tivesse sido com a cara do António Costa, isto é, um PS à Costa, outro galo cantaria. Os eleitores olharam para a carinha do Tó Zé, sentiram ali muita moleza, não gostaram do sorriso angelical, tipo papo-de-anjo, nem da vozinha meio aflautada, vai daí, abstiveram-se ou votaram no Marinho, que fala mais grosso e descasca o pessegueiro todo.

Ora um PS à Costa ameaça ser também uma coisa de barba rija, de voz encorpada, abaritonada. Mas a coisa não está nada fácil. E complica-se porque há muita gente que ainda não se esqueceu do PS à Sócrates, todo ele parlapié de primeira apanha, pimpão, aquele PS onde nada do que parecia era – ou se era, era sempre como se não fosse, ou vice-versa, ou seja, onde qualquer intrujice tinha ares da verdade mais absoluta. Não era o PS propriamente dito; era o PS à Sócrates, que nada tinha a ver com o PS verdadeiro. E

 também ainda há quem se lembre do PS à Guterres, uma espécie de pântano profilático, quase monástico, muito bem soletrado, mas de onde se saiu completamente de tanga, o Barroso que o diga. Note-se mais uma vez: o PS à Guterres não era o verdadeiro PS. Guterres era meio lasso, um beato, quase de batina, paramento que cairá a matar num presidente cá do saguão, que para o que é – e para quem é – bacalhau basta. E para suceder à cavacada, até um Tomaz qualquer servia.

E, claro, há o PS primordial, à Mário Soares, mas esse foi chão que deu uvas. Outros tempos. Esse é que era um PS de arromba! Pachola, funâmbulo, truão, impostor, ilusionista, enfim, um circo completo. O PS à Marocas era aquele que tirava tudo da cartola: o socialismo de rosto humano, a Europa connosco, mas paga lá isso com os contratos a prazo, os salários em atraso e a indústria que se copule. E as maravilhosas privatizações a saírem da manga do lado direito, enquanto que da manga do lado esquerda saía a chave da gaveta mágica onde meteu o socialismo e, zás, um fogaréu à maneira e lá desapareceram o socialismo, a gaveta, a chave, a secretária e, mais um bocado, até o país ia desaparecendo.

Foi por essa altura, em 1977, que veio o FMI na sua Versão Número Um, que deixou uns trocos e levou 111 toneladas de ouro. Isto é: foi aí que começou a grande farra. O PS à Marocas haveria ainda de trazer o FMI, na Versão Número Dois, decorria o ano de 1983. Uma maravilha: congelamento de investimentos públicos; descida de salários reais na função pública (“servindo de exemplo para as negociações salariais do sector privado”, como assinala a carta de intenções) e congelamento de admissões de trabalhadores; subida de impostos e imposição de um imposto especial sobre o rendimento - um corte de 28% no subsídio de Natal de 1983. Ou seja: subida de preços, queda de salários reais, disparar do desemprego.

Mas, atenção: O PS à Marocas era o PS à Marocas. O verdadeiro PS era – seria – outra coisa. Ou apenas uma ideia. Pois claro. O PS – o PS, Partido Socialista (salvo seja e benza-o Deus) – nunca teve nada, nadinha, mesmo, a ver com isto. O PS queria, quer e quererá sempre o contrário daquilo que os seus secretários-gerais fizeram, ou fazem.

O Marocas foi à vida e sentiu-se uma passarinho – um passarão, melhor dizendo – a quem abriram a gaiola. O Guterres entrou em pânico e fugiu do pântano – e até lhe ia dando uma coisinha má. Refugiou-se na ONU, a tratar dos refugiados; o Sócrates safou-se da prisa, ou do hospício, e foi aprender a falar franciú à conta de umas economias misteriosas; o bom do Tó Zé vai, um dia destes, pastar ovelhas, a quem confessará que nunca ouviu falar de uma assinatura que o PS fez no Memorando de Entendimento com a Troika. As ovelhas dirão méééé, o que deixará o Tó Zé muito contente.

(Um breve parênteses para recordar que estes Pê Esses todos sempre se deram bem, no essencial, com o PSD e o CDS. Chegaram a viver juntos em S. Bento e, entre um arrufo ou outro, a verdade é que com papel assinado, ou em união de facto, têm mantido uma relação muito estável. O amor tem destas coisas, e quando há química…).

É aqui, então, que entra um Costa, socialista dos quatro costados, que chegou recentemente a Lisboa, vindo de um recôndito ponto da Via Láctea, ou mesmo da sua vizinha, Andrómeda, ele às vezes há coisas que ninguém sabe ao certo. Seja como for, vai ser este Costa o tal Messias que, pela primeira vez na vida, dará ao PS, dando-se ele próprio, um dirigente verdadeiramente socialista. E o PS será, então, um partido de esquerda. O Costa vai descobrir a chave e a gaveta onde o Mário meteu o socialismo, limpá-lo muito bem e – Aleluia! Aleluia! – dar ao Povo o que é do Povo. Fazer cumprir Abril.

Ou seja: o Costa vai parir o verdadeiro PS. Até agora, o que andou por aí era um PS insuflável. E a malta toda a masturbar-se só de olhar para aquilo, a pensar que era a sério.

Ó Costa, apressa-te filho! Se não, quem vende a Caixa Geral de Depósitos ainda é o Coelho.