Na
hora da despedida…
Carta
Aberta a Joaquim Santos
(o ainda)
Presidente da Câmara Municipal do Seixal
Desde a constituição das listas para as autárquicas de 2021,
só os eleitores do Seixal mais atentos e informados – isto é: os munícipes mais
aptos (e que, infelizmente, não são assim tantos como seria desejável) para
avaliar os ardis partidários – é que perceberam que você não iria terminar o
Mandato ao qual se apresentou, como cabeça de Lista, pela CDU, à presidência da
autarquia.
Por estar bem informado, não fui um dos enganados.
- Primeiro, porque, no quadro geral de candidatos ao
cargo, nem um merecia o valor do papel do meu voto, nem o tempo que gastaria a
deslocar-me às urnas;
- E segundo, porque, ainda que você merecesse o meu
voto, eu já sabia que o futuro presidente da CMS não se chamaria Joaquim Santos
(caso vencesse as eleições), mas que isso estava reservado à segunda figura
dessa lista, passados que fossem alguns meses sobre a tomada de posse. E até
sei que essa figura não foi nada consensual.
Aproveito para revelar o outro motivo que também me levou à
abstenção, já que poderia ir às urnas, nem que fosse para votar branco ou nulo:
foi tirar argumentos maliciosos às pessoas de mau carácter – que abundam nas
diversas tribos partidárias – e que logo aproveitariam para garantir que eu votara
em qualquer outra força política, pela qual teria renegado a minha ideologia.
Abstendo-me, cortei o mal pela raiz.
Esclarecido que está este aspecto, vou começar pelo seu
inquestionável mérito enquanto presidente da CMS, o qual me parece consensual:
Você é o tecnocrata que se dedicou a sanear – a pôr na devida
ordem – as contas da Autarquia que herdou de Alfredo Monteiro. Ponto!
Mas não lhe reconheço mais nenhum mérito. Ou melhor: para
além disso – que não foi pouco, admito! – direi que passou por cá como figura
pardacenta, sem carisma, sem humildade, sem empatia, sem ligação real e
afectiva à população e aos trabalhadores autárquicos. Nunca foi aceite – e,
muito menos, sentido – como coisa nossa. Do Povo, como se costuma dizer.
Como gestor dos recursos humanos foi um patrão do piorio.
Rancoroso, vingativo e incapaz de gerar – ou gerir – consensos; tem em tribunal
vários processos que o obrigam a ordenar recursos sobre recursos, pois não
passam de causa perdidas, que os contribuintes vão ser obrigados a pagar no
final das contas.
Tem sido um maná para escritórios de advogados, com tudo o
que isso implica.
Não foi, em suma, um autarca comunista, como Alfredo Monteiro
já não o tinha sido. E não é. Foi mais um presidente de câmara igual a muitos
outros que abundam pelo país fora, e em momento algum houve em si a marca
distintiva de um edil comunista. Há autarcas de várias forças políticas
perfeitamente idênticos a si, aos quais só os correligionários conseguem tecer
elogios.
Empatia com a população? ZERO!
Melhor que Monteiro? Era fácil!
Aliás, desde as eleições autárquicas de 1998 que a gestão
municipal passou, no Seixal, a ser uma coisa híbrida, sem chama, sem alma, sem
amor e dedicação, estribada – ou valendo-se – apenas, na tradição democrática
do Concelho do Seixal e na fidelidade do seu eleitorado, assim desgastando e
corroendo a imagem e o património material e imaterial – ideológico, se
preferirmos - deste concelho, construído, desde o 25 de Abril, por autarcas nos
quais toda a população se revia.
Ou seja: não basta ser bom nas contas. É preciso não entender
a gestão autárquica como um altar, uma varanda ou um pedestal de onde se exerce
o PODER e se debitam umas ave-marias. Não basta atingir o alvo.
Aquilo a que um autarca deve aspirar não é, apenas, a ganhar
as eleições. É, acima de tudo, usar essa vitória para, através do seu trabalho,
se afirmar como «AQUELE QUE SERVE».
E aquele que serve não é «O SENHOR
PRESIDENTE», mas «ALGUÉM QUE APENAS EXERCE ESSE CARGO»
em nome e a favor da sua população sem, no entanto, deixar de ser o cidadão em
que os seus concidadãos confiaram.
Você, Joaquim Santos, nunca foi capaz de ser um de nós, nem
aquele a quem a população deu a honra de estar a defendê-la, contra tudo e
contra todos, em cada dia do seu mandato.
Na última Assembleia Municipal (27 de Junho de 2022) quis,
essencialmente, não o deixar abandonar o cargo sem o confrontar com a forma
desgraçada como compactuou com as agressões contra o Meio Ambiente e contra a
Saúde Pública (depois veremos se irão ser crimes ambientais, como se julga,
havendo fortes indícios disso mesmo) praticadas, ao longo dos anos, por uma
empresa – a SN-Seixal, SA, do Grupo Espanhol MEGASA – que você sempre protegeu
extremosamente.
E fê-lo em três fases muito bem definidas:
Primeiro, negando, até ao limite do mais absurdo descaramento, a existência
desses atentados ambientais;
Segundo, sacudindo a água do capote, quando a negação deixou de ser possível,
despachando toda e qualquer capacidade de intervenção para a administração
central, da qual já sabia que nenhuma resposta iria haver. Era notório, já
nessa altura, como a administração central e a administração local se
completavam na protecção ao infractor.
Terceiro, (e fê-lo sempre em vésperas de eleições – 2017 e
2021), fingindo
assumir as suas responsabilidades, que reiteradamente, até aí, se negara a
assumir, sabendo que, dessas iniciativas, nenhum resultado sério se
obteria, porque as regras do jogo estavam – e estão – viciadas.
Nessa sessão da Assembleia Municipal antes referida,
pretendi, ao mesmo tempo, colocá-lo perante um espelho que reflectisse aquilo
que definiu o seu mandato à frente da Câmara Municipal do Seixal.
Questionei-o sobre a falta de resposta a um requerimento
apresentado por Os Contaminados – Associação de Protecção do Ambiente e
da Qualidade de Vida, nos seguintes termos:
«No dia 9 de
Setembro do ano passado enviámos à Câmara Municipal do Seixal um conjunto de
dez questões relacionadas com a remoção de resíduos resultantes da atividade
siderúrgica. Dias depois a Câmara respondeu-nos dizendo, e cito, “a
Câmara Municipal do Seixal está a reunir, junto da Baía do Tejo, a informação
requerida pela V/ Associação sobre as operações realizadas e resíduos removidos,
a qual será remetida com a maior brevidade possível”.
Pois bem,
Sr. Presidente, passaram nove meses desde a V/ resposta e continuamos a não ter
eco às perguntas colocadas, pelo que lhe perguntamos:
- O porquê
de ainda não termos essa informação e,
- O que tem
feito a Câmara Municipal para - mesmo sendo aquela uma incumbência da Baía do Tejo
- resolver o problema?
Mas já que
estamos aqui, aproveito também para lhe falar de outro tema relacionado com o
passivo industrial do concelho e com a acção, ou inacção, da Câmara Municipal: os
estudos epidemiológicos.
Passados
todos estes anos - e relembro que este assunto já faz para o ano dez anos -
continuamos a não ter resposta à pergunta que se impõe:
Quantos casos
de Carcinoma de Pulmão e Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica ocorreram entre a
população de Aldeia de Paio Pires e trabalhadores e antigos trabalhadores da
MEGASA, só nos últimos 30 anos?
É bom que se
esclareça o seguinte:
1. NINGUÉM, residindo perto da
SN/MEGASA, ou nela trabalhando, ou tendo trabalhado, foi alvo de qualquer exame
à sua condição de saúde, no âmbito de qualquer estudo;
2. No estudo realizado, a população de
Aldeia de Paio Pires, que ronda as 15 mil pessoas, foi metida num pacote de
avaliação com cerca de 50 mil indivíduos;
3. Foi passada à população a ideia “de
que a exposição aos poluentes identificados, não constitua um risco maior para
a saúde”.
4. Esqueceram-se foi de referir algo que
o Prof. Pedro Aguiar igualmente disse (e disse-o logo de seguida) – e citamos:
“que também não se pode inferir, de forma definitiva, que a exposição aos
poluentes identificados, NÃO constitua um risco maior para a saúde”;
Por isso,
Sr. Presidente, o que lhe perguntamos é:
a) sabe ou não a Câmara Municipal
quantos casos de Carcinoma de Pulmão e Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica
ocorreram entre a população de Aldeia de Paio Pires?
b) Para quando os Estudos Médicos que, após a
inconclusividade dos realizados, o senhor prometeu?».
Em resposta, fiquei a saber que os novos Estudos Médicos por
si prometidos à população de Aldeia de Paio Pires, dado os realizados terem
sido inconclusivos, JÁ NÃO SERÃO FEITOS.
E que você ainda considera que os Estudos anteriores
garantiram que não há provas de que a saúde da população esteja a correr riscos
devido à poluição a que está sujeita.
Sou obrigado a chamar-lhe, sem medo de me enganar, mentiroso
e pessoa sem palavra.
Você mentiu à população que jurou defender, pois, face à inconclusividade dos
estudos realizados, afirmou que iria promover novos estudos, desta vez com base
em dados adequados para o efeito.
Você, sem mais explicações, faltou, também à sua palavra.
Você manteve – ainda – a afirmação falaciosa de que os estudos médicos realizados
concluíram que nada indicava que a poluição emitida pela SN-Seixal, SA, da
MEGASA, tivesse efeitos negativos na população de Aldeia de Paio Pires.
Você sabe, Joaquim Santos que os estudos acrescentam que também «NÃO SE PODE
dizer o contrário».
Em tempo de despedida, responda-me, Joaquim Santos (a mim e à
desprezada população de Aldeia de Paio Pires):
- Que estranho poder é esse que a administração da MEGASA tem
sobre si para levar um autarca comunista – digamos assim – a mentir e a faltar
à sua palavra?
- Não considera uma traição à sua população – e,
eventualmente, aos seus valores morais e ideológicos – tudo ter feito, ao longo
de anos a fio, para negar a realidade que aqui se vive?
- Não acha uma tristeza pôr em causa a sua própria
honorabilidade nessa pulsão cega de proteger um Grupo Económico que atenta,
diariamente, contra a Saúde Pública e o Meio Ambiente?
- Porque se negou a colocar, permanentemente, Estações de Medição
da Qualidade do Ar e do Ruído, entre a fábrica e a sua (desculpe se o pronome
possessivo é inadequado) população?
- Iria isso contra os interesses da MEGASA?
- Porque não mandou recolher – e enviar para análise, em
entidade certificada – as partículas que todos nós apanhamos, engolimos e
respiramos?
- Porque nunca admitiu a hipótese de, com os dados existentes
– que provavam que a fábrica emite partículas potencialmente cancerígenas –
recorrer aos tribunais?
- A MEGASA zangava-se consigo?
- O que o levou a mascarar a poluição com origem na fábrica
da MEGASA, com uma fantasia muito abrangente e colorida, chamada «poluição
da actividade industrial»?
- Foi a MEGASA que exigiu? Ou foi de borla?
- Alguma vez supôs, em 2014, que, decorridos oito anos, ainda
existiriam pessoas que não se cansariam de lutar e que não se deixariam enrolar
com manobras dilatórias, cada uma delas mais repelente que as anteriores?
- Você, Joaquim Santos, vai-se embora sem ter aprendido a
mais elementar premissa que aprendeu um grande autarca comunista:
«Tudo – mas absolutamente TUDO – o que acontece no Concelho
do Seixal, diz sempre respeito à Câmara».
(Eufrázio Filipe)
Desejo-lhe, mesmo a acabar, que o seu futuro job
(consta por aí que vai ser director executivo numa coisa chamada Transportes
Metropolitanos de Lisboa), possa merecer mais atenção da sua parte do que
aquela que a população de Aldeia de Paio Pires mereceu.
João Carlos Lopes Pereira.
Cidadão