10.30.2007

Era uma vez um país




No saguão reinam os vermes

O (re)casamento do senhor Pinto da Costa foi a notícia da semana para grande parte da nossa imprensa. Aliás, o senhor Pinto da Costa é notícia sempre que emite um som, seja ele de que natureza for. Por isso, se me permitem, não vou falar do ilustre noivo, como, aliás, não falarei do Cristiano Ronaldo, nem da Lili Caneças, nem dessa coisa trangénica a quem chamam, salvo erro, o «Conde», designado outras vezes por José Castelo Branco, ou de figuras afins da nossa melhor sociedade. Isto é: não vou falar dos portugueses verdadeiramente «importantes» deste país.

E se, na minha prosa, vierem a lume outros nomes conhecidos, designadamente, ministros, políticos, grandes empresários e outros valorosos varões (ou barões) da mandança lusitana, não será por eles, enquanto indivíduos, mas pelos efeitos que produzem entre a ralé a que pertenço com – diga-se de passagem – bastante orgulho.

Começo por Alberto Costa, o ministro da Justiça, que veio prometer alterações ao novo Código de Processo Penal, mas só para 2009. Quer isto dizer que é preciso dar tempo a que processos como os da Casa Pia, Apito Dourado e todos os que se relacionem com os grandes crimes económicos, com a grande banqueirada à mistura, terminem sem complicações para nenhum dos implicados, com a exclusão natural do senhor Silvino, mais conhecido por Bibi, e de outra arraia miúda que venha à rede.

Falando nisto, recordo o que li há dias, escrito pelo jornalista António Ribeiro Ferreira:
As palavras do senhor Procurador-geral da República, Pinto Monteiro, vêm a público no momento em que voltam a surgir à luz do dia novas acusações sobre os abusos sexuais a alunos da Casa Pia. (…) A ex-provedora Catalina Pestana veio denunciar a continuação da actividade de uma rede de pedófilos no interior da instituição. Os gritinhos indignados sobre as escutas são a poeira necessária, veremos se é suficiente, para desvalorizar e colocar em segundo plano o facto de senhores muito importantes do regime continuarem a ir buscar crianças à Casa Pia para satisfazer os seus criminosos desejos pedófilos. Desde que o escândalo rebentou em finais de 2002, uma grande parte da classe política, com o PS à cabeça, e altas figuras do Estado fizeram tudo o que era possível e impossível para abafar o caso e evitar que os pedófilos fossem condenados. Substituíram o procurador Souto Moura por Pinto Monteiro, destruíram a brigada que investigou os crimes sexuais, afastaram Catalina Pestana e alteraram o Código Penal e o Código de Processo Penal».

Não se pode ser mais claro. Mas vindo à baila o PS, logo nos lembramos desse interessante fenómeno da corrupção, sendo impossível esquecer o que se passa no julgamento de Felgueiras e o que se está a passar em Coimbra, onde a Polícia Judiciária local investigou à lupa, durante dois anos, os negócios de Luís Vilar, dirigente e autarca socialista naquela cidade. E o que descobriu a PJ? Conto-vos o que li no Correio da Manhã:

«Descobriu que o vereador, sem pelouro e sem ordenado na Câmara, conseguiu nos últimos anos amealhar uma fortuna invejável. No processo é evidenciado que Vilar era o homem do “dinheiro” em Coimbra, o principal “financiador” do PS, ao ponto de Vítor Baptista, candidato à presidência, precisar que aquele fosse avalista da sua campanha. Foi feita uma livrança de 100 mil euros para que a mesma se concretizasse, tendo ainda Vilar emprestado 20 mil euros ao candidato a presidente. Os negócios foram investigados e embora o MP acabasse por propor o arquivamento de muitos destes casos, uma verdade tornou-se evidente. As cumplicidades no poder local geram compadrios difíceis de entender».

Esta edificante história inclui empresários, com negócios pendentes na autarquia, que emprestam dinheiro a vereadores e como, por esta e por outras vias, se financiam as campanhas eleitorais. No meio disto tudo, surgem lotes de prédios com andares a mais, tendo o feliz construtor entregue a Luís Vilar dez mil euros para a campanha do PS. Curiosamente, o PS só recebeu metade dessa verba, e o recibo não foi passado ao empresário, mas ao próprio Vilar, que assim aparece como benemérito.

Mas onde a história começa a ter suco é quando entra em acção a famosa Bragaparques. Voltemos ao CM, que nos conta:

«Há duas versões para uma história que assenta no depósito de 50 mil euros, em dois cheques, na conta do vereador e líder da concelhia do PS, Luís Vilar. O Ministério Público assegura que se tratou de um caso de corrupção (e acusou Domingos Névoa, da Bragaparques, e o autarca socialista do crime de corrupção na forma passiva e activa), enquanto os envolvidos garantem que foi apenas um empréstimo. Luís Vilar precisava de dinheiro para um negócio, que depois acabou por não concretizar, e pediu ao amigo empresário que lho adiantasse. Domingos Névoa teria dado o dinheiro ao “amigo” vereador, e António Vilar devolveu-lho, passadas algumas semanas, mas em dinheiro e sem hipótese de o comprovar.O procurador público que assina a acusação diz exactamente o contrário. Na altura em que os cheques entraram na conta do autarca, (Março de 2002), ainda estava em discussão a construção de um parque de estacionamento construído pela empresa, em Coimbra. A Bragaparques adquirira um terreno em hasta pública e conseguira, em clara violação do regulamento camarário, adquirir um segundo lote para um parque de dimensões anormais.

Luís Vilar também não conseguiu explicar às autoridades por que é que pediu o dinheiro emprestado ao empresário. Afinal, os extractos das suas contas nos três meses anteriores e posteriores mostram saldos de 110 mil euros. Nesse mesmo período de tempo, Luís Vilar também fez aplicações financeiras de 550 mil euros, numa altura em que, segundo o próprio, precisava que Domingos Névoa lhe emprestasse os 50 mil euros.

A PJ investigou o negócio à volta da construção do parque de estacionamento na zona do Bota Abaixo, no Largo das Olarias, em Coimbra, e verificou que em 1999 foram alienados dois terrenos naquela zona, só tendo a Bragaparques conseguido comprar um deles. Pode depois ler-se no processo que “contra os termos do regulamento do concurso”, a Bragaparques conseguiu juntar os dois lotes, promovendo a construção de um parque de estacionamento de maiores dimensões. Com este negócio obteve elevados lucros que foram indevidos por os terrenos terem sido adquiridos a baixo custo
».

Veremos agora no que vai dar isto tudo, com o socialista Luís Vilar e o empresário da Bragaparques, Domingos Névoas, a serem os únicos acusados no meio de tanta bagunça. Uma coisa é certa: percebe-se melhor agora por que se opôs o PS ao pacote legislativo contra a corrupção proposto por João Cravinho, agora desterrado – e silenciado – num cargo qualquer perdido no meio desta Europa connosco.

Não sei porquê, mas tudo isto me trouxe à ideia que o Governo prevê gastar no próximo ano mais de 190,4 milhões de euros em estudos, pareceres, projectos e consultadorias. Uma verba que representa um aumento de 74 milhões (62%) em relação ao montante de 116 milhões despendido este ano. Não! Não estou a pensar em comissões, em favores, em habilidades dessas. Deus me livre!

E enquanto o Banco de Portugal concede créditos aos seus administradores para a compra de habitação, há um homem da ralé, chamado Francisco Sousa, que desabafa: «Ainda há gente boa neste Mundo. Se não fossem os amigos, eu já tinha morrido.» O desabafo de Francisco traduz a cruel realidade da sua vida. Sem saúde nem força para trabalhar, sem dinheiro, sem nada, este homem vive numa casa em Chãos, nos arredores de Viseu, sem as mínimas condições e onde falta tudo. Ou quase tudo.

O seu caso tornou-se mais complicado quando, há cerca de três semanas foi hospitalizado devido a problemas respiratórios, «a juntar aos outros». Antes de ter alta, foi avisado pelos médicos de que teria de passar a noite e grande parte do dia ligado a um ventilador. Francisco Sousa resignou-se à situação, mas ficou desesperado quando soube que o aparelho só funcionava ligado à energia eléctrica. «Como é que vou fazer?», interrogou-se na altura, sabendo que a sua casa não tem electricidade. Porque neste país não há só gente como aquela que eu referi atrás, o problema foi resolvido no próprio dia em que teve alta hospitalar. O vizinho, Artur Campos, prontificou-se a ajudar e emprestou a luz.

A vida de Francisco Sousa “não tem sido fácil”, como fácil não é a vida de muitos milhões de portugueses. Solteiro e apenas com 105 euros que recebe do rendimento social de inserção, dinheiro que mal chega para comprar os medicamentos, reconhece que a sua sorte é viver rodeado de pessoas amigas e que ajudam os pobres. “Sem este vizinho que me deu a luz, não sei como iria respirar”, diz ele.

É como os administradores do Banco de Portugal. Se não lhes emprestassem dinheiro para as casitas, onde é que os pobrezitos iam morar, não me dizem?

5 comentários:

São disse...

Eu estou sem palavras, porque a única que me apetece dizer não a posso escrever aqui. Embora eu concorde com o marquês de Fronteira na sua defesa da dignidade do palavrão.
Porque face a certas coisas e em determinadas ocasiões, de facto, só mesmo o palavrão!!
Abraço grande!

Anónimo disse...

Concordo: raio-que-os-parta!

Monte Cristo disse...

Para a São:

Desabafa à vontade. Nenhuma palavra pode ser pior do que as políticas assassinas. Esta gente que governa mata por decreto. Esvai o povo. Esmaga-lhe a dignidade. Castra-o pela manipulação ideológica. E pouco faltará para que as bastonadas e as masmorras voltem a ser necesárias «a bem da nação». Democrática(mente).

Ao Anónimo

Sejamos os raios.

O Puma disse...

Sempre disse que o psd

está a perder terreno para ser

oposição

Sócrates e o ps estão a ultrapassar todas as formas políticas de ser direita

A banca está a comandar o país

Monte Cristo disse...

Tens razão, Puma.

O PSD, com Menezes, é uma anedota com barbas e algália.

O PS, com Sócrates, é uma União Nacional de cor-de-rosa vestida.

Ele, apesar da pose (ou talvez por ela), cheira-me a eunuco.

Por isso, «isto vai», amigo Puma, «isto vai».