O
seu dinheiro é mesmo seu?
Um dia, dizem-lhe que, devido à situação económica do país, que «andou a viver acima das suas possibilidades», os ordenados e pensões foram congelados. Na prática, você vai passar a poder comprar menos coisas porque, entretanto, subiram o g...ás, a electricidade, a água, os transportes, as taxas moderadoras, a prestação da casa, os seguros obrigatórios, o selo do carro, as portagens, os combustíveis, os livros e o material escolar dos seus filhos ou netos e, claro está, os preços daquilo que se come.
No outro dia, dizem-lhe que a crise se agravou, porque «andámos a viver acima das nossas possibilidades», e que vão ser necessários mais alguns sacrifícios. Nessa altura, aumentam-se os impostos directos e indirectos, reduzem-se os escalões do IRS – outra forma de pagarmos mais impostos – dizem-lhe que a sua casa, apesar de valar cada vez menos, passou a valer o dobro, de maneira que o IMI passou, também ele, para o dobro. Como o IVA aumentou, tudo aquilo que se compra para (sobre)viver também aumentou, de maneira que você, se até aqui comprava menos, agora quase não compra nada que não seja absolutamente essencial. Nalguns casos – e cada vez mais casos – nem isso.
No dia seguinte, porque as medidas tomadas não estão a alcançar os resultados ambicionados (houve muita gente que avisou para isso mesmo, garantindo, até, que teriam um efeito contrário ao que se dizia pretender) você foi informado que, a somar a tudo o que já lhe tinha sido exigido, ainda lhe iriam ficar com parte do que ganha, sejam rendimentos do trabalho, sejam reformas e pensões, devidas por anos e anos de descontos e que – pensava você - eram sagradas, intocáveis.
Entretanto – e enquanto lhe diminuíam a massa salarial – obrigavam-no a trabalhar mais horas, a ser pior remunerados pelo trabalho extraordinário, a fazer aquilo para que não foi contratado, a não ter horário fixo nem dia de descanso obrigatório, ou seja, a estar praticamente disponível, a qualquer hora e a qualquer dia, para a sua entidade patronal. Você deixou de ser uma pessoa com vida própria, para passar a ser mais uma ferramenta da sua empresa.
Agora, você – que nunca andou a viver acima das suas possibilidades – está à beira de deixar de poder cumprir as suas obrigações perante entidades com as quais, baseado naquilo que ganhava, assumiu, de boa-fé, compromissos absolutamente ao seu alcance. E, de repente, a sua mulher foi despedida. E os seus filhos, que também tinham a vida deles organizada, batem-lhe à porta a pedir ajuda, porque o desemprego também bateu à porta deles.
Então, você começa a pensar que nada do que tem é seu. Nem o ordenado – ou a reforma – nem a casa, nem o carro, nem o fogão, nem a cama, nem o relógio, nem a aliança de casamento. Nem – e é isso o que mais o assusta – futuro. Nada do que tem é seu. Você, os seus filhos, os seus pais, se ainda os tiver, os seus amigos, os seus colegas, toda a gente não é dona de nada, nem daquilo que comprou com dinheiro honestamente ganho. O governo pode entrar em sua casa e fazer de si gato-sapato. De si e de toda a gente.
Nisto, você pensa: de toda a gente? Ou só de gente como eu? Será que o governo entra em caso do senhor Belmiro como entra na minha? E na do senhor Ulrich? E na do senhor Soares dos Santos? Afinal, porque será que o governo me tira dinheiro, trabalho, saúde, educação e anos de vida mas, coloca milhares de milhões de euros em bancos privados? Que fiz eu de mal, que os banqueiros fizeram tão bem?
Nessa altura, você repara na televisão e percebe que, em Chipre, nem o dinheiro que as pessoas como você tinham nos bancos está a salvo da sangria. Assusta-se, mas logo aparece na TV uma cara conhecida, quase sorridente. Calma, diz o tipo: aqui, em Portugal, nada disso vai acontecer.
Quando está quase a recuperar do susto, você lembra-se que foi precisamente aquele filho da puta que ainda há poucos meses lhe dizia que os seus subsídios de férias e de Natal eram sagrados, e que nunca seriam pela austeridade e pelo aumento de impostos que a crise seria vencida.
É verdade: você também foi um dos que acreditou no gajo, não foi?
No outro dia, dizem-lhe que a crise se agravou, porque «andámos a viver acima das nossas possibilidades», e que vão ser necessários mais alguns sacrifícios. Nessa altura, aumentam-se os impostos directos e indirectos, reduzem-se os escalões do IRS – outra forma de pagarmos mais impostos – dizem-lhe que a sua casa, apesar de valar cada vez menos, passou a valer o dobro, de maneira que o IMI passou, também ele, para o dobro. Como o IVA aumentou, tudo aquilo que se compra para (sobre)viver também aumentou, de maneira que você, se até aqui comprava menos, agora quase não compra nada que não seja absolutamente essencial. Nalguns casos – e cada vez mais casos – nem isso.
No dia seguinte, porque as medidas tomadas não estão a alcançar os resultados ambicionados (houve muita gente que avisou para isso mesmo, garantindo, até, que teriam um efeito contrário ao que se dizia pretender) você foi informado que, a somar a tudo o que já lhe tinha sido exigido, ainda lhe iriam ficar com parte do que ganha, sejam rendimentos do trabalho, sejam reformas e pensões, devidas por anos e anos de descontos e que – pensava você - eram sagradas, intocáveis.
Entretanto – e enquanto lhe diminuíam a massa salarial – obrigavam-no a trabalhar mais horas, a ser pior remunerados pelo trabalho extraordinário, a fazer aquilo para que não foi contratado, a não ter horário fixo nem dia de descanso obrigatório, ou seja, a estar praticamente disponível, a qualquer hora e a qualquer dia, para a sua entidade patronal. Você deixou de ser uma pessoa com vida própria, para passar a ser mais uma ferramenta da sua empresa.
Agora, você – que nunca andou a viver acima das suas possibilidades – está à beira de deixar de poder cumprir as suas obrigações perante entidades com as quais, baseado naquilo que ganhava, assumiu, de boa-fé, compromissos absolutamente ao seu alcance. E, de repente, a sua mulher foi despedida. E os seus filhos, que também tinham a vida deles organizada, batem-lhe à porta a pedir ajuda, porque o desemprego também bateu à porta deles.
Então, você começa a pensar que nada do que tem é seu. Nem o ordenado – ou a reforma – nem a casa, nem o carro, nem o fogão, nem a cama, nem o relógio, nem a aliança de casamento. Nem – e é isso o que mais o assusta – futuro. Nada do que tem é seu. Você, os seus filhos, os seus pais, se ainda os tiver, os seus amigos, os seus colegas, toda a gente não é dona de nada, nem daquilo que comprou com dinheiro honestamente ganho. O governo pode entrar em sua casa e fazer de si gato-sapato. De si e de toda a gente.
Nisto, você pensa: de toda a gente? Ou só de gente como eu? Será que o governo entra em caso do senhor Belmiro como entra na minha? E na do senhor Ulrich? E na do senhor Soares dos Santos? Afinal, porque será que o governo me tira dinheiro, trabalho, saúde, educação e anos de vida mas, coloca milhares de milhões de euros em bancos privados? Que fiz eu de mal, que os banqueiros fizeram tão bem?
Nessa altura, você repara na televisão e percebe que, em Chipre, nem o dinheiro que as pessoas como você tinham nos bancos está a salvo da sangria. Assusta-se, mas logo aparece na TV uma cara conhecida, quase sorridente. Calma, diz o tipo: aqui, em Portugal, nada disso vai acontecer.
Quando está quase a recuperar do susto, você lembra-se que foi precisamente aquele filho da puta que ainda há poucos meses lhe dizia que os seus subsídios de férias e de Natal eram sagrados, e que nunca seriam pela austeridade e pelo aumento de impostos que a crise seria vencida.
É verdade: você também foi um dos que acreditou no gajo, não foi?
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