3.26.2013


AVISO

O Café do Canto está com problemas


Ficam informados todos os clientes do Café do Canto, propriedade do senhor Hermengardo Montoso, que, tendo em vista evitar a falência do mesmo, vão ser chamados a participar na recuperação económica deste estabelecimento.

 

Mais se informa que  será exigido a cada cliente a entrega de uma verba correspondente a 40% do seu consumo médio diário, reportado aos últimos 12 meses. O Plano de Recuperação Económica do Café do Canto, também conhecido como Resgate, foi aprovado pelo Governo, depois de auscultados o FMI, o BCE e o Goldman & Sachs.

 

Mais se informa que o Café do Canto, tal como qualquer banco, é privado, cabendo assim aos seus clientes sanear todo o tipo de problemas que a respectiva gestão tenha provocado e não queira, não saiba ou não possa resolver.

Nota - Não se aceitam reclamações do tipo: «Eu bem avisei que entrar na CEE ia dar merda». Ou ainda: «Ai, quiseste entrar no Euro, não quiseste? Agora, não te queixes. Paga e não bufes».

 
A Bem da Europa!

Toma lá, que é democrático.

 

3.24.2013

O seu dinheiro é mesmo seu?
 
 
Um dia, dizem-lhe que, devido à situação económica do país, que «andou a viver acima das suas possibilidades», os ordenados e pensões foram congelados. Na prática, você vai passar a poder comprar menos coisas porque, entretanto, subiram o g...ás, a electricidade, a água, os transportes, as taxas moderadoras, a prestação da casa, os seguros obrigatórios, o selo do carro, as portagens, os combustíveis, os livros e o material escolar dos seus filhos ou netos e, claro está, os preços daquilo que se come.

No outro dia, dizem-lhe que a crise se agravou, porque «andámos a viver acima das nossas possibilidades», e que vão ser necessários mais alguns sacrifícios. Nessa altura, aumentam-se os impostos directos e indirectos, reduzem-se os escalões do IRS – outra forma de pagarmos mais impostos – dizem-lhe que a sua casa, apesar de valar cada vez menos, passou a valer o dobro, de maneira que o IMI passou, também ele, para o dobro. Como o IVA aumentou, tudo aquilo que se compra para (sobre)viver também aumentou, de maneira que você, se até aqui comprava menos, agora quase não compra nada que não seja absolutamente essencial. Nalguns casos – e cada vez mais casos – nem isso.

No dia seguinte, porque as medidas tomadas não estão a alcançar os resultados ambicionados (houve muita gente que avisou para isso mesmo, garantindo, até, que teriam um efeito contrário ao que se dizia pretender) você foi informado que, a somar a tudo o que já lhe tinha sido exigido, ainda lhe iriam ficar com parte do que ganha, sejam rendimentos do trabalho, sejam reformas e pensões, devidas por anos e anos de descontos e que – pensava você - eram sagradas, intocáveis.

Entretanto – e enquanto lhe diminuíam a massa salarial – obrigavam-no a trabalhar mais horas, a ser pior remunerados pelo trabalho extraordinário, a fazer aquilo para que não foi contratado, a não ter horário fixo nem dia de descanso obrigatório, ou seja, a estar praticamente disponível, a qualquer hora e a qualquer dia, para a sua entidade patronal. Você deixou de ser uma pessoa com vida própria, para passar a ser mais uma ferramenta da sua empresa.

Agora, você – que nunca andou a viver acima das suas possibilidades – está à beira de deixar de poder cumprir as suas obrigações perante entidades com as quais, baseado naquilo que ganhava, assumiu, de boa-fé, compromissos absolutamente ao seu alcance. E, de repente, a sua mulher foi despedida. E os seus filhos, que também tinham a vida deles organizada, batem-lhe à porta a pedir ajuda, porque o desemprego também bateu à porta deles.

Então, você começa a pensar que nada do que tem é seu. Nem o ordenado – ou a reforma – nem a casa, nem o carro, nem o fogão, nem a cama, nem o relógio, nem a aliança de casamento. Nem – e é isso o que mais o assusta – futuro. Nada do que tem é seu. Você, os seus filhos, os seus pais, se ainda os tiver, os seus amigos, os seus colegas, toda a gente não é dona de nada, nem daquilo que comprou com dinheiro honestamente ganho. O governo pode entrar em sua casa e fazer de si gato-sapato. De si e de toda a gente.

Nisto, você pensa: de toda a gente? Ou só de gente como eu? Será que o governo entra em caso do senhor Belmiro como entra na minha? E na do senhor Ulrich? E na do senhor Soares dos Santos? Afinal, porque será que o governo me tira dinheiro, trabalho, saúde, educação e anos de vida mas, coloca milhares de milhões de euros em bancos privados? Que fiz eu de mal, que os banqueiros fizeram tão bem?

Nessa altura, você repara na televisão e percebe que, em Chipre, nem o dinheiro que as pessoas como você tinham nos bancos está a salvo da sangria. Assusta-se, mas logo aparece na TV uma cara conhecida, quase sorridente. Calma, diz o tipo: aqui, em Portugal, nada disso vai acontecer.

Quando está quase a recuperar do susto, você lembra-se que foi precisamente aquele filho da puta que ainda há poucos meses lhe dizia que os seus subsídios de férias e de Natal eram sagrados, e que nunca seriam pela austeridade e pelo aumento de impostos que a crise seria vencida.

É verdade: você também foi um dos que acreditou no gajo, não foi?

3.06.2013


Os avós e os netos

A manifestação do dia 2 de Março deixou claro que são cada vez mais – e mais diversos quanto à sua origem social, idade e situação financeira – os cidadãos que se indignam face às políticas governamentais. Para quem, como eu, tem marcado presença, ao longo dos anos, nas incontáveis acções de protesto contra as políticas de sucessivos governos, é indesmentível que assistimos agora a algo de novo: aparecem a manifestar a sua indignação – e, em muitos casos, a sua revolta – pessoas que, segundo elas próprias afirmam, sempre se tinham manifestado… contra as manifestações.

Jorge Jesus disse, há dias, citando Marx, que a prática é o critério da verdade. De alguma forma, esta expressão aplica-se a todo um mundo de novos manifestantes que aparecem a exigir o fim das políticas do governo, já que foi preciso sentirem na pele a «prática» de uma vergasta chamada austeridade para, finalmente, abrirem os olhos para uma «verdade» que lhes passava ao lado. Ainda não lutam por outra política, mas lutarem pelo «fim destas políticas» já é um passo em frente.

Primeiro, foram os mais jovens, lançados para o gueto da dependência paterna, desempregados crónicos ou sujeitos a trabalhos precários e ocasionais, miseravelmente pagos, portugueses a quem um bufão pífio que nunca trabalhou, sempre abrigado no alpendre partidário onde confluem dinheiros públicos e fundos comunitários – estou a falar da Tecnoforma, por exemplo – pede para não serem piegas e que vejam lá se o melhor não será pirarem-se daqui para fora.

Agora, são os avós, que, de um dia para o outro, vêem as suas pensões reduzidas brutalmente, depois de uma vida de trabalho e de descontos, logo num momento em que são chamados a ajudar os filhos e os netos, pois o desemprego real já passa do milhão e meio – e continua a aumentar – coisa que do facínora que é primeiro-ministro só merece o comentário de que estamos perante algo perfeitamente previsível.

O que falta que a maioria dos portugueses perceba – especialmente estes, os que agora a violência das políticas trazem às ruas – é que nada do que está a acontecer resulta de algo que oscila entre a fatalidade de uma Crise inoportuna e a incompetência de meia dúzia de políticos.

Quando os portugueses perceberem que a Crise e as políticas do governo se enquadram numa vasta e consciente manobra de pilhagem destinada a transferir uma fatia cada vez maior da riqueza produzida dos bolsos de quem trabalha para os cofres do capital financeiro, então a tal luzinha ao fundo do túnel deixará de ser uma miragem. Nessa altura, todos terão percebido que Gaspar e Coelho não eram umas lamentáveis aberrações políticas, mas diligentes carrascos a cumprirem a sua nefanda missão.

Na verdade, um cartaz que apareceu na manifestação de 2 de Fevereiro resumia tudo isto muito bem:

Só deixam de nos morder se lhes partirmos os dentes.

3.01.2013

EU VOU
 
NO DIA 2 DE MARÇO,
AJUDAR PORTUGAL
A LIBERTAR-SE DO JUGO.
DOS SIPAIOS, DOS VENDIDOS,
DOS MIGUÉIS DE VASCONCELOS,
DOS VAMPIROS.
 
PORQUE ELES
 
 
SÓ PARAM
DE
NOS MORDER
SE LHES PARTIRMOS
OS DENTES