5.03.2008

Sobre os donos dos homens


Eles
- do arroz, dos cereais e de outras «minas»...

Enquanto o arroz sobe, contribuindo para o alastrar a fome que por aí existe, o destaque não pode ir para a invasão de esquadras policiais por bandos de marginais. Realmente, por muito que esta lixeira se pareça, cada vez mais, com uma república das bananas, e por muito significativa do deboche a que chegámos sob o consulado do «engenheiro» Sócrates, esta novidade do assalto a esquadras policiais nada é comparado com a falcatrua monumental da «crise do arroz». Será, por isso, sobre o que ela significa, que falaremos hoje.

Então, de repente, os senhores que mandam na economia, que fazem e refazem as crises – e as gerem de acordo com as suas conveniências – (e daqui para diante designados por Eles), inventaram a questão do arroz. Em consequência, o seu preço disparou. Parece que, em Portugal, já subiu 16%.

Quem ganha? Os grandes produtores, os grandes armazenistas, os grandes distribuidores. E – é claro! – os governos, já que o IVA, mesmo mínimo, passa a produzir uma colecta maior.

Quem perde? Não vale a pena dizer. Todos sabemos quem perde.

Os mecanismos são sempre os mesmos. Eles começam por falar em quebras de produção, em diminuição drásticas das reservas estratégicas (coisas que o cidadão comum não sabe bem o que é – e, se souber, nunca poderá confirmar), lança-se o fantasma do racionamento, sugere-se o espectro da fome, e aí está o baile armado. Quando o produto escasseia, por um dia ou dois, nas prateleiras, o rastilho começa a arder. Em pânico, o consumidor procura precaver-se. Já não pensa no preço, mas em açambarcar. Paga o que pode e o que não pode, mesmo que, depois, o arroz crie bicho na prateleira da despensa. O arroz, esse é que nunca mais voltará ao preço antigo.


A «mina» do petróleo

Se pensarmos um pouco, perceberemos que o mesmo se passa com a chamada crise do petróleo e a respectiva escalada de preços. Porque é que o petróleo estava, há poucos anos, a 30 dólares (e já se dizia que estava caríssimo), e agora, que está a cento e muitos dólares, se desce uns cêntimos já se diz que ficou barato? Porque é, afinal, que o petróleo sobe?

Eu recordo algumas das razões por Eles apontadas:

- Ou é porque estamos na época dos furacões no Golfo do México;

- Ou é porque as reservas dos EUA estão abaixo do previsto;

- Ou é porque a Nigéria vive dias de instabilidade;

- Ou é porque a vaga de frio nos EUA levou a um aumento do consumo;

- Ou é porque a vaga de calor nos EUA levou a um aumento do consumo;

- Ou é pela crise no Médio Oriente;

- Ou é pelo aumento de procura nos países emergentes, como a China e a Índia;

- Ou é porque o Irão pode estar a construir um reactor nuclear;

Ou é porque a Coreia do Norte disparou um míssil terra-ar;

- Ou é porque os EUA ameaçam invadir outro país qualquer (produtor de petróleo, está bem de ver);

- Ou é porque houve mais uma ameaça terrorista (mesmo que anteriores nunca se tenham confirmado);

- Ou é porque há greve dos trabalhadores num determinado complexo extractivo;

- Ou é porque as reservas mundiais não são tão consideráveis como se julgava.

Enfim. Eles têm sempre uma justificação. Ou várias. Esgotadas todas elas, um dia dirão que é petróleo que tem vontade própria e que só aceita ser extraído se o preço do barril aumentar todos os dias. Mas a única, a verdadeira, aquela que nunca nos é dita, é esta: o preço do petróleo aumenta porque Eles querem. Eles – e não deus, nem o diabo, nem o clima, nem qualquer outro factor humano ou natural.

O petróleo aumenta porque isso é do interesse das grandes empresas petrolíferas e dos seus governos. Ponto final.

Voltando à questão do arroz e dos cereais

Eles não dizem que a produção agrícola mundial foi, em 2007, de 2,3 mil milhões de toneladas de cereais, ou seja, mais 4% do que no ano anterior. Nem que, se desde 1961, a produção mundial de cereais triplicou, a população apenas duplicou. Sendo assim, que razões existem para esta aparente escassez de cereais e para a sua vertiginosa subida de preço? Sem dúvida, que as gritantes desigualdades que assolam o planeta, tanto mais imorais quanto é certo que os povos das regiões que mais riqueza produzem acabam por ser, em regra, quem menos delas beneficiam. Mas também é certo que essas carências são cada vez mais acentuadas por uma coisa maquiavélica e nefanda que por aí anda há cerca de três décadas, e que dá pelo nome de globalização neoliberal. Ou seja: uma globalização feita por Eles e à medida d’Eles.

Então, o que está a acontecer é que bens essenciais ao desenvolvimento da sociedade humana (caso do petróleo) e ao seu bem-estar e sobrevivência (caso dos cereais e dos bens alimentícios, em geral) estão entregues ao sistema especulativo do quem-dá-mais, brincando-se, deste modo, com a vida – no sentido literal do termo – de milhões de seres humanos.


Biocombustíveis: a nova «mina»

Na verdade, o trigo e outros cereais, que deveriam servir para alimentar as pessoas, estão agora a ser vistos como fontes de produção de combustíveis – os chamados biocombustíveis – tendo em vista uma alternativa ao petróleo, já que, apesar das recentes descobertas de novas jazidas – as mais importantes das quais no Brasil – ele, o petróleo, não passa de um recurso finito.

Poderão alguns dizer que, sendo o petróleo um recurso natural não renovável, que fontes energéticas alternativas devem ser encontradas, no sentido de garantir que as bases civilizacionais existentes possam ser mantidas. De acordo. Mas já não estarei de acordo se me disserem que esses recursos, necessários para a sobrevivência, bem-estar e progresso de toda a humanidade, devem estar na posse de alguns (os tais Eles), e assim entregues à lógica do regateio, do quem-dá-mais… e por aqui me sirvo.

Em primeiro lugar, porque o planeta não é d’Eles, mas de todos o que o habitam; em segundo lugar, porque não são Eles, mas outros milhões de seres humanos, que produzem, extraem, transformam, contabilizam, transportam e distribuem esses bens.


Eles, a água e o ar

Ora, se esta lógica não se inverter, um dia destes teremos que Eles, como donos disto tudo – das riquezas naturais e dos meios de produção – farão com a água o que estão a fazer com petróleo e o arroz e outros cereais. Ou a pagamos ao preço que a sua gula infinita ditar, ou morreremos à sede.

(Aliás, esta experiência já foi encetada em vários países, sendo, neste preciso momento, um dos sonhos do Partido Socialista e da restante direita, recordando-se, a propósito, que Sócrates vem, desde os seus tempos de ministro do Ambiente, dando passos seguros nesse sentido, designadamente com a criação das empresas multimunicipais e a ideia de privatizar todos os serviços de captação e distribuição de água).


Por isso, cantava o Zeca que Eles comem tudo. Falta acrescentar que também bebem (ou querem beber) tudo.

E quando for possível controlar a própria atmosfera, Eles também quererão ser donos do ar. Então, nada faltará para serem nossos donos, tendo sobre nós direitos de vida e de morte.

Como, de certo modo, já têm.

5 comentários:

O Puma disse...

UM DIA TALVEZ O POVO

SE LEVANTE

E FAÇA DE UM CRAVO

UMA ESPINGARDA

Graça Pires disse...

Eles comem tudo... Talvez rebentem!
Um beijo meu Amigo de sempre.

São disse...

Só comem porque nós deixamos, não?
Que a Luz nos ilumine!!
Beijos, caro amigo.

São disse...

Querido amigo, tens um mimo para ires buscar lá em casa.
Sê feliz!

Anónimo disse...

O problema grave é dar "O aval de milhares de milhões de euros aos bancos..."
Pois hão milhares de famílias Portuguesas a morrer à fome...
Vejam o mau exemplo do BCP...

Liga-te a mim...

Um abraço...