5.24.2007

A co-incineração e a Censura segundo Sócrates



Discreta e sofisticada, de máscara democrática e farpela à socialista, a censura aí está. Voltou reciclada. Mas voltou. Agora, não se farda de coronel mentecapto, nem usa outro lápis que não seja para salientar as pestanas. Não corta nem amputa artigos. Não confisca livros. Não está ligada (que se saiba) à sede de nenhuma polícia política. A Censura, agora, não cheira a farda, nem a botas, nem a cavalariça. Veste fatos das melhores marcas, perfuma-se com os mais caros olores. E fala com vozinha melosa, adocicada, assexuada, estranha.

A Censura, hoje, funciona no gabinete do senhor «engenheiro» José Sócrates e nos gabinetes dos seus incontáveis assessores. Mas o censor não existe. Não se sabe se é homem, mulher, ou assim-assim. O velho lápis azul, prévio e grosso, deu lugar ao telefonema «indignado», ao e-mail truculento, ao fax «esclarecedor», à conversa de reposteiro com o chefe de redacção, o director-adjunto ou, mesmo, com o senhor director.

Hoje, da televisão aos jornais, passando pela rádio, toda a gente sabe o que deve - ou não - escrever ou dizer. Não é bom para a carreira de nenhum jornalista dar notícias que desagradem ao senhor «engenheiro». Começou por ser inconveniente, e agora é claramente perigoso não se alinhar pela socratiana verdade oficial. Ser-se do «contra» pode tirar o pão da boca.

Há dias, o governo sofreu nova derrota no Tribunal Central Administrativo do Sul, que confirmou a suspensão da co-incineração de resíduos perigosos na Arrábida. Com ínfimas excepções, a comunicação social ignorou o assunto. Isto é: não quis arreliar o senhor «engenheiro», que viu, mais uma vez, contrariada a sua paranóica obsessão. Na conferência de imprensa que os presidentes das câmaras municipais de Setúbal, Palmela e Sesimbra promoveram, acompanhados do advogado que representa estas autarquias na sua luta pela saúde pública, nem uma estação de televisão apareceu. Pensemos no alarido que seria, caso a decisão tivesse sido a inversa

É verdade. Um silêncio de chumbo, negro, opressivo, alastra por todo o lado. O caso do professor que se referiu à trafulhice com a licenciatura de Sócrates é apenas mais um episódio desse alastrar. A bufaria sente-se estimulada a defender o «chefe». Os boys e girls, desejosos de conservarem - ou aumentarem - as suas sinecuras, já não respeitam amigos ou colegas. Bufam, na esperança de treparem mais uns degraus, pois há muito que perceberam que ar se respira e que é o vale-tudo a ditar a nova ordem «democrática». E «socialista».

Pois é. Nos dias que correm, democracia, socialismo, liberdade de expressão, direito à saúde, ao trabalho e à remuneração valem o mesmo que certos diplomas.

Nada.

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