5.27.2007

O sono do Zé


O Zé adormeceu. Hibernou. Há que diga que é uma coisa atávica, que sempre foi assim, que vivemos perpetuamente hibernados, alheios de nós. Não irei tão longe. Estaremos, apenas, a passar pelas brasas.

Enquanto isso, no país que é nosso - mas cuja posse demoramos a tomar - os pastores partem e repartem o pasto pelos senhores morgados. Sobram-nos cardos e erva seca. Acordamos - quando acordamos - mais pobres do que antes de cada sesta.

As nossas mulheres estão a aprender a parir em ambulâncias, chãos de garagens ou em terras de Espanha. Os nossos filhos calcorreiam quilómetros para chegarem à escola mais próxima. Morremos, porque a urgência hospitalar foi levada para lá do sol-posto. Roemos as unhas, porque perdemos o emprego e o pão que dele vinha. Voltamos a tirar o barrete, respeitosamente, e a curvar a coluna, em solícita vénia, para que nos seja concedida a graça de um trabalhito, por mais precário e mal pago que seja. Perdemos a casa, porque os pastores de Bruxelas decidem que os juros devem continuar a subir para que os banqueiros acrescentem mais grãos aos seus celeiros. Os velhos morrem de solidão e de vergonha pelos fiados que têm na farmácia. Por já não serem gente

Todos os dias nos apresentam uma nova factura, uma nova exigência, uma nova canga. E nós - o Zé - estremunhados, pagamos. Sem um PORQUÊ?, sem um BASTA!, sem um grunhido que seja.

Vai longa sesta. É quase um coma irreversível.

1 comentário:

Monte Cristo disse...

Não sabia que a colonização ianque já tranaformara o inglês no idioma oficial - ou, pelo menos, de uso corrente.

Em idioma indígena, sempre direi que este blog não se destina a agradar a todos. Se ele desagradar aos que vivem na lua - seja qual for o lado - já está a cumprir uma parte do seu objectivo.

Parece que foi o caso.

Monte Cristo