5.23.2007

E dir-nos-emos deuses


- É o maior diamante do mundo.
-
Não - corrigiu o cigano - É gelo.
Gabriel Garcia Marques
Cem Anos de Solidão

Faremos, de pedras afagadas pela dor torrencial das mãos,
as casas e os caminhos pendulares do tédio imperecível.
Na letargia do sonho, sob o silêncio luminosos das estrelas,
criaremos rosas já abertas, e do musgo afirmaremos
ser oposto ao sol. E dir-nos-emos sábios.

Imporemos às palmeiras o rigor da linha recta,
e aos rios definiremos margens isentas de limos e meandros.
Depois, rasgaremos o espaço com uivos laminados,
coagulando o azul e o vento. E dir-nos-emos fortes.

Ensinaremos ao cão os equívocos do sangue,
e acrescentaremos aos muros as farpas vidradas da renúncia.
Circularemos em redor do ouro, modelando peixes com olhos de rubi,
e com eles compraremos o prazer e a verdade. E dir-nos-emos lúcidos.

Mataremos, então, em nome dos valores eternos,
reclamando dos púlpitos a posse da razão fundamental,
e desabando sobre os ímpios a força da nossa mão intacta.
E dir-nos-emos sérios. E dir-nos-emos justos.

E quando recordarmos a pergunta original,
para decidirmos que a transparência agulhada do gelo
é o esplendor estelar dos diamantes,
nenhum tempo faltará para que nos digamos deuses.

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